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O que é o amor – Parte 2

O amor como união de almas: Entre a filosofia de Aristóteles, os ensinamentos de Jesus e a inspiração na arte e literatura.

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Na primeira parte desta série de artigos, exploramos a concepção do amor na mitologia e filosofia grega, destacando Hesíodo e a figura primordial de Eros. Inicialmente interpretado como uma força cósmica capaz de gerar harmonia a partir do caos, Eros foi reinterpretado por Platão, que elevou o conceito de amor, conectando-o à busca pela verdade e pelo bem. Nesta segunda parte, partimos para a visão particular de Aristóteles sobre o amor, traçando também paralelos com os ensinamentos de Jesus Cristo e refletindo sobre como a arte e a literatura têm tentado capturar esse sentimento universal.

O amor como unidade de almas em Aristóteles

Aristóteles, discípulo de Platão, trouxe uma visão mais concreta e terrena sobre o amor. Enquanto Platão via o amor como uma jornada ascendente, que nos leva do desejo físico ao conhecimento puro, Aristóteles tratava o amor como uma união íntima entre duas pessoas, uma espécie de fusão de almas em corpos distintos. Sua perspectiva se enraizava na realidade dos relacionamentos humanos, nos quais o amor era visto como uma expressão ética do desejo mútuo pelo bem-estar e pela virtude.

Na obra Ética a Nicômaco, Aristóteles descreve a amizade (philia) como uma das formas mais elevadas de relacionamento. No ápice dessa amizade, surge uma forma de amor em que os amantes se tornam inseparáveis, ligados por valores e virtudes compartilhados. Aristóteles nos convida a enxergar o amor como uma conexão que transcende os desejos momentâneos e as paixões passageiras, tornando-se um compromisso ético de crescimento mútuo.

A importância da amizade no amor aristotélico

A compreensão do amor em Aristóteles está profundamente ligada à sua visão sobre a amizade. Ele distingue três tipos: por utilidade, por prazer e pela virtude. Apenas a amizade baseada na virtude é verdadeiramente duradoura, pois não depende de interesses externos ou temporários. Nesse tipo de relacionamento, o amor surge como uma forma de altruísmo, onde cada indivíduo deseja o bem do outro, não por conveniência, mas por genuína apreciação de quem o outro é.

Essa visão de Aristóteles contrasta significativamente com as concepções modernas de amor, muitas vezes associadas à gratificação imediata e à satisfação pessoal. Ele nos oferece um retrato mais profundo e ético do amor, baseado em respeito, confiança e um propósito comum de virtude.

O amor de Jesus Cristo

Embora Aristóteles e Jesus venham de contextos filosóficos e religiosos diferentes, ambos compartilham uma visão comum do amor como um compromisso altruísta. Para Jesus, o amor é mais do que uma virtude; é a essência de sua mensagem. “Amai-vos uns aos outros” (João 13:34) é um mandamento que ecoa o conceito aristotélico de desejar o bem do outro tanto quanto o próprio.

No entanto, enquanto Aristóteles vê o amor como uma parceria virtuosa entre iguais, Jesus amplia esse conceito para incluir todos os seres humanos, até mesmo os inimigos. O amor cristão, assim, não se restringe a amizades ou relacionamentos românticos, mas é estendido a toda a humanidade. Em ambos os casos, seja no pensamento de Aristóteles ou nos ensinamentos de Cristo, o amor não é apenas uma emoção, mas uma disposição ética que exige compromisso e sacrifício.

O amor como unidade de propósito

Para Aristóteles, o amor também implica uma unidade de propósito. Os amantes verdadeiros não apenas desejam o bem um do outro, mas trabalham juntos para alcançá-lo. Essa colaboração mútua em busca de um bem maior reflete a ideia de que o amor é uma força ativa e transformadora. Da mesma forma, Jesus ensina que o amor deve se manifestar em atitudes concretas e ações que promovam o bem comum.

Essa ideia de amor como uma ação comprometida é fundamental tanto para Aristóteles quanto para Jesus, destacando que o amor vai além de palavras ou sentimentos; ele se expressa por meio de gestos e atitudes práticas.

O amor na arte e na literatura

A busca pela representação do amor é uma constante na história, e a arte e a literatura têm sido os meios mais poderosos de tentar capturar sua essência. Obras literárias como Romeu e Julieta, de Shakespeare, e Os Miseráveis, de Victor Hugo, mergulham nas profundezas do amor humano, explorando suas alegrias, tragédias e dilemas morais. Em Romeu e Julieta, Shakespeare apresenta um amor que desafia as barreiras sociais e familiares, culminando em um sacrifício trágico. Já em Os Miseráveis, Hugo nos mostra o amor em suas diversas formas – desde o amor paternal até o amor incondicional pela humanidade, demonstrado no personagem de Jean Valjean.

A arte também se dedicou a explorar o amor em todas as suas facetas. Esculturas clássicas como as de Eros e Psiquê, e pinturas renascentistas que retratam casais apaixonados, capturam a intensidade desse sentimento. A beleza do amor, em todas essas representações, reside justamente em sua complexidade: é simultaneamente sublime e trágico, espiritual e físico, altruísta e egoísta.

Essas representações artísticas e literárias são tentativas humanas de compreender e expressar algo que muitas vezes escapa à racionalidade. Elas ecoam as reflexões filosóficas de Aristóteles e os ensinamentos de Jesus, na medida em que nos lembram que o amor é uma experiência essencialmente humana e universal, repleta de profundidade e significado.

O amor como força ética e transformadora

Seja na filosofia aristotélica ou nos ensinamentos de Jesus, o amor é apresentado como uma força poderosa que transcende o tempo e o espaço. Mais do que um sentimento ou uma paixão momentânea, o amor é uma ética de vida, um compromisso que nos desafia a buscar o bem do outro tanto quanto o nosso próprio.

Essa visão do amor, presente tanto na filosofia quanto nas artes, reflete um chamado constante para que nos superemos e cultivemos relacionamentos baseados na virtude, no altruísmo e no respeito mútuo. Em um mundo frequentemente marcado por divisões, conflitos e egoísmo, o amor se ergue como uma luz que nos guia, nos inspirando a agir com bondade e compaixão.

Ao observarmos como o amor é representado na literatura e na arte, vemos que, independentemente das formas que ele assume, a mensagem subjacente é a mesma: o amor é uma força transformadora, capaz de mudar vidas e sociedades. Amar, portanto, é mais do que um simples ato de afeição; é uma prática que requer ação, compromisso e a busca constante pelo bem comum.


Para saber mais

  • Aristóteles. Ética a Nicômaco. Traduções e estudos diversos.
  • Giovanni Reale. História da Filosofia Antiga.
  • Platão. O Banquete. Obras completas e comentários críticos.
  • Hesíodo. Teogonia. Traduções e interpretações acadêmicas.

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