O Primeiro Grupo de Aviação de Caça (1°GAvCa) completa hoje (18/12) 70 anos de existência. O grupo, criado em 18 de dezembro de 1943 para atuar durante a Segunda Guerra Mundial, teve como primeiro comandante o então Major-Aviador Nero Moura, que havia trabalhado na aviação do exército e servia no Gabinete do Ministério da Aeronáutica.
Foi o Major Nero Moura quem escolheu os homens que iriam desempenhar as funções mais importantes da Unidade Aérea. E, para isso, instituiu o voluntariado, em todos os níveis hierárquicos, como primeiro critério de seleção para todos os integrantes do Grupo. Essa característica foi essencial para que o pessoal mantivesse o moral elevado durante todo o combate na Itália. As vagas foram rapidamente preenchidas.
“O Major Moura Neto exerceu o comando sem usar somente os galões. Comandou com o exemplo. A liderança era exercida em terra e no vôo. Quando nos comandava no ar, tínhamos a certeza de chegar ao alvo no minuto certo. Expunha-se ao fogo antiaéreo igualzinho aos seus tenentes”, ressalta Rui Moreira no livro Senta a Pua!, que na época era 1° Tenente-Aviador.
O núcleo do 1° GAvCA era constituído por 32 oficiais e praças. Todos se submeteram a um processo de instrução aérea nos Estados Unidos durante sete meses, após concluírem um período de treinamento no Brasil.
Enquanto isso, no Brasil, 320 militares eram selecionados e preparados para atuar durante a guerra, inclusive, 40 oficiais aviadores. Em março, eles se encontraram com o grupo que já estava no Panamá e foram reunidos para a realização da fase de instrução seguinte.
O Republic P-47 foi escolhido como avião do grupo por sua força e resistência em combate.
O ciclo de Instrução foi concluído no dia 31 de agosto de 1944. No dia 19 de setembro, o 1°GAvCa embarcou para a Itália. Ao chegar ao porto de Nápoles, eles se depararam com a real destruição da guerra, e, sem condições de desembarcar, deslocaram-se para o porto de Livorno, onde chegou no dia 6 de outubro, partindo imediatamente para a Base Aérea de Tarquínia. Em 11 de novembro, o 1° Grupo de Aviação de Caça abriu fogo contra o nazismo. Ao total, foram foram 445 missões.
O dia 22 de abril marcou o maior número de missões realizadas em solo italiano por pilotos brasileiros no conflito: foram 11 ataques aos alemães em um só dia e, por isso, é considerado até hoje o dia da aviação de caça. Mas o esforço não acabou ali. Por mais três dias os pilotos brasileiros voaram dez missões diárias.
A guerra acabou com a vitória dos aliados e a atuação do grupo se transformou em história que está contada no livro “Heróis dos Céus – a Iconografia do 1° Grupo de Aviação de Caça na Itália”, publicado pela Action Editora e, também, no já citado livro “Senta a Pua!”.
Este ano morreram os três últimos pilotos veteranos da Segunda Guerra: o Major-Brigadeiro Miranda Côrrea faleceu dia 15 de setembro; o Major-Brigadeiro Rui Moreira Lima foi sepultado em agosto e o Major-Brigadeiro José Rebelo Meira de Vasconcelos morreu em março.
Linha do Tempo
1939 – Começa a 2ª Guerra Mundial
1941 – É criada a Força Aérea Brasileira
Abril/1942 – Os caças Curtiss P-36A e bombardeios North American B-25B chegam ao Brasil
Agosto / 1942 – Submarinos alemães atacam navios brasileiros e o país decide combater na guerra
Dezembro/1943 – É criado o 1° Grupo de Aviação de Caça, sob o comando do então Major-Aviador Nero Moura
Janeiro/1944 – O núcleo do 1º GAvCa chega aos Estados Unidos para realizar treinamento durante sete meses
Março/1944 – Mais de 300 militares chegam ao Panamá para, também, participarem de treinamento
Abril/1944 – O efetivo é transportado para Aguadulce, no Panamá, onde os pilotos voam em aviões P-40
Maio/1944 – O grupo é considerado unidade de caça operacional e empregado na defesa do Canal do Panamá.
Julho/1944 – O P-47 Thunderbolt é escolhido como avião do grupo, entre três opções, pela sua força e resistência em combate.
Agosto/1944 – Termina o treinamento do 1°GAvCa
Outubro/1944 – o 1° GAvCa chega a Itália para participar efetivamente da guerra.
Abril / 1945 – O dia 22 de abril marcou o maior número de missões realizadas em solo italiano por pilotos brasileiros no conflito: foram 11 ataques aos alemães em um só dia e, por isso, é considerado até hoje o dia aviação de caça.
Senta a Púa! A história da Força Aérea Brasileira na Segunda Guerra
A Segunda Guerra Mundial já acontecia na Europa quando o Presidente Getúlio Vargas sancionou, em 20 de janeiro de 1941, o decreto-lei nº 2.961, criando o Ministério da Aeronáutica. Joaquim Salgado Filho, designado primeiro Ministro da pasta, buscava, primeiramente, estruturar o setor aéreo no Brasil, aprimorando sistemas de controle do espaço aéreo e fundando aeródromos. Ainda em 1941, foi criada a Diretoria de Rotas com o objetivo de promover o desenvolvimento da infraestrutura e da segurança da navegação aérea. No entanto, ainda em seus primeiros passos – fundando escolas e aeródromos – a Força Aérea Brasileira (FAB) foi obrigada a ingressar em um teatro de operações extracontinental. Nele, a Aviação de Caça brasileira teve seu batismo de fogo – e papel fundamental no cumprimento de missões em solo italiano.
Até então, o Brasil adotava uma posição neutra em relação aos embates relacionados à Segunda Guerra. A Declaração do Panamá estabelecia, desde 1939, uma zona de segurança de 300 milhas onde os países americanos se comprometiam a manter a neutralidade – incluindo o litoral do Brasil. Mas tudo mudou quando navios brasileiros começaram a ser atacados durante o episódio que ficou conhecido como a Batalha do Atlântico Sul. Em 28 de janeiro de 1942, o Brasil rompeu as relações diplomáticas com os países do Eixo, marcando o apoio aos Aliados. Mais tarde foi a vez da Aviação de Caça da FAB entrar no conflito: desta vez, em território italiano, junto aos aliados.
A declaração de guerra do Brasil aos países do Eixo, em 22 de agosto de 1942, determinou uma mobilização geral. Em 18 de dezembro de 1943, foi criado o Primeiro Grupo de Aviação de Caça (1º GAVCA) e, em 20 de julho de 1944, a Primeira Esquadrilha de Ligação e Observação (1a ELO). Para comandar as unidades aéreas na Itália, foram designados, respectivamente, o Major Aviador Nero Moura e o Capitão Aviador João Affonso Fabrício Belloc. Ambos chegaram à Europa em outubro de 1944. Assim, em três anos, o Brasil fundou uma Força Aérea, investiu em formação, infraestrutura e aumento do efetivo e, enfim, desembarcou em um cenário de guerra real.
O 1º GAVCA saiu do Brasil com 350 homens, incluindo 43 pilotos, e chegou a Livorno integrando o 350th Fighter Group da Força Aérea Americana. Antes disso, o grupo aliado havia realizado a Operação Torch, no Norte da África, e seguiu até a Itália. Além do 1º GAVCA, eram três esquadrões, todos norte-americanos: 345th, 346th e 347th Fighter Squadron. Para eles, o 1º GAVCA, equipado com os P-47 Thunderbolt, era conhecido como “1st Brazilian Fighter Squadron (1st BFS)”, com o código “Jambock”. A partir de sua base, em Tarquínia, na Costa Oeste da Itália, o 1º GAVCA passou a planejar suas próprias operações em 11 de novembro. O Brasil ainda enviou uma equipe de médicos e enfermeiros à Itália, atuando junto ao Esquadrão e no US 12th General Hospital, em Livorno.
O símbolo do Grupo foi idealizado a bordo do navio a caminho da Itália. Dos elementos: a moldura auriverde simboliza o Brasil; o céu vermelho, a guerra; o avestruz, o piloto de caça brasileiro, que precisou se adaptar a diferentes alimentos em suas missões; o escudo azul com o Cruzeiro do Sul é o símbolo das Forças Armadas do Brasil; e a arma empunhada pelo avestruz, o poder de fogo do P-47. “Senta a Púa!” é o grito de guerra do 1º GAVCA. Já o Hino da Aviação de Caça foi composto após uma missão bem sucedida na quarta-feira de cinzas de 1945 – o “Carnaval em Veneza”.
Durante a Guerra, o 1º GAVCA operou como unidade independente, e as missões em fevereiro de 1945, quando os caças da FAB atacaram o inimigo em Monte Castelo, contribuíram para a vitória dos combatentes da Força Expedicionária Brasileira (FEB). Nos Estados Unidos, os brasileiros haviam sido treinados para operações de caça, mas a Luftwaffe (Força Aérea Alemã) executava poucas missões na região. Logo, o esquadrão atuou como unidade de caça-bombardeiro, em missões de reconhecimento armado e interdição, em suporte às forças terrestres aliadas. O clímax da atuação da Força Aérea Brasileira foi em 22 de abril de 1945, quando uma grande ofensiva dos Jambocks contabilizou 44 decolagens em 11 missões em um único dia.
O dia amanheceu nublado. As três esquadrilhas (verde, azul e vermelha) do Grupo levantaram voo a partir das 8h30 com o objetivo de atacar estruturas e veículos próximos a San Benedetto. Uma delas decolou pouco depois em direção ao sul de Mantua, para uma missão de reconhecimento armado – mais de 80 veículos foram destruídos, além de fortes, tanques e balsas. Ao fim do dia, o Grupo acumulou 44 missões individuais e destruiu mais de 100 alvos. 22 de abril de 1945 foi o dia com o maior número de missões de combate despachadas, sendo celebrado até hoje como o Dia da Aviação de Caça. Dois P-47 foram avariados e um abatido e seu piloto capturado pelas forças alemãs.
Além do 1º GAVCA, a 1ª ELO apoiou a Artilharia Divisionária (AD) da FEB, realizando missões de observação, ligação, reconhecimento e regulagem de tiro. A 1ª ELO realizou 684 missões em quase 200 dias de operações.
Quatro décadas depois, em 1986, os feitos do 1º GAVCA na Itália foram novamente reconhecidos. O Grupo recebeu do Embaixador dos Estados Unidos no Brasil e do Secretário da Força Aérea Americana, a Presidential Unit Citation, comenda concedida pelo governo norte-americano. Além do 1º GAVCA, só duas unidades estrangeiras foram agraciadas com a medalha – ambas da Força Aérea Australiana.
Fotos: Arquivo CENDOC e Sargento Johnson Barros / CECOMSAER
FAB – Agência Força Aérea