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São Tomás de Aquino, O Senhor dos Anéis e a virtude da prudência

Prudência é saber distinguir as coisas desejáveis das que convém evitar - Cícero

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Na vastidão das obras literárias e filosóficas, algumas histórias transcendem o tempo e oferecem uma riqueza de ensinamentos que vão além de mero entretenimento. “O Senhor dos Anéis”, a aclamada obra de J.R.R. Tolkien, é um exemplo disso. A sua conexão com a filosofia de São Tomás de Aquino, um dos maiores pensadores da Idade Média, e a virtude da prudência exemplifica como a última desempenha um papel fundamental na vida dos personagens e como pode ser aplicada em nossas próprias vidas.

A pessoa prudente é aquela que age de forma ponderada, levando em conta a sabedoria adquirida pela experiência e pelo conhecimento, evitando impulsividade e tomando decisões com cuidado e responsabilidade. A prudência não se limita apenas à autoproteção, mas também considera o bem-estar dos outros e o impacto de nossas ações no contexto social. É uma virtude fundamental para uma vida equilibrada, guiada pelo bom senso e pela razão, buscando o alcance de fins nobres e evitando excessos e perigos desnecessários.

São Tomás de Aquino, um teólogo e filósofo dominicano do século XIII, cujas obras ainda são amplamente estudadas e admiradas nos dias de hoje, defendia, em sua abordagem filosófica, o tomismo, ideia caracterizada pela sua aceitação do uso da razão na especulação teológica, mas sem confundir seu domínio com o da fé, em uma notória a influência platônica e, sobretudo, aristotélica.

Dentre as muitas virtudes discutidas por Aquino, destacou-se a virtude da prudência como a capacidade de discernir o que é bom e agir corretamente em diferentes situações. Ela envolve a razão prática, que nos permite escolher os meios adequados para atingir fins nobres.

A virtude da prudência

Dentre as muitas virtudes discutidas por Aquino, destaca-se a virtude da prudência. Podemos defini-la como a capacidade de discernir o que é bom e agir corretamente em diferentes situações. Ela envolve a razão prática, que nos permite escolher os meios adequados para atingir fins nobres.

Aquino entendia a prudência como uma das quatro virtudes cardeais, juntamente com a justiça, a fortaleza e a temperança. É a virtude que governa a razão prática, ou seja, a capacidade humana de tomar decisões com base na moralidade, nos permitindo discernir o que é bom e agir corretamente.

Uma característica fundamental da prudência é o uso adequado da razão. Ela envolve a aplicação da razão prática para determinar os meios adequados para alcançar um fim moralmente bom. Também requer sabedoria, análise cuidadosa das circunstâncias e uma visão da consideração das consequências de nossas ações. Leva em conta os princípios morais e éticos, buscando o equilíbrio entre o interesse pessoal e o bem comum.

O filósofo argumenta que a prudência não é apenas uma virtude individual, mas também tem um papel importante na governança e na vida em sociedade. Ele destaca a importância da prudência na tomada de decisões políticas, na administração da justiça e na busca pela paz. A prudência permite aos governantes e líderes agirem de forma justa e sábia, considerando o bem comum e promovendo o bem-estar da sociedade como um todo.

A prudência também não é considerada uma virtude estática, mas algo que pode ser desenvolvido e aperfeiçoado por meio da experiência e da busca constante da virtude. Neste sentido, requer prática e exercício contínuo, assim como o desenvolvimento de um caráter virtuoso.

Na filosofia de São Tomás de Aquino, a prudência nos guia na tomada de decisões corretas, considerando cuidadosamente as circunstâncias e os princípios morais. O legado de Aquino continua a inspirar e influenciar comportamentos, a cultura, estudos e filósofos até os dias atuais, destacando a importância da prudência em nossa busca pela vida virtuosa.

O Senhor dos Anéis e a prudência

Dentre os personagens de “O Senhor dos Anéis”, um exemplo marcante de prudência é Bilbo Bolseiro, um hobbit, uma pessoa comum, sem superpoderes, que se torna protagonista da história de J.R.R. Tolkien, embarcando em uma jornada épica. No início de sua aventura, Bilbo demonstra hesitação e cautela ao enfrentar os desafios que se apresentam. Neste “chamado” ao desafio e à medida que a história se desenrola, ele aprende a confiar em sua intuição e a tomar decisões prudentes.

Em sua jornada, Bilbo entende que o anel é uma grande tentação e que seu poder pode corromper até mesmo os mais nobres corações. Ao perceber a influência do anel em sua vida, Bilbo decide deixá-lo para trás, passando-o para seu jovem sobrinho Frodo. Essa decisão é um exemplo claro de prudência, pois Bilbo reconhece que ele próprio não é capaz de resistir às tentações do anel e age de acordo com esse entendimento.

Além disso, a prudência de Bilbo é testada quando ele se depara com Gollum, a criatura sinistra que também deseja o anel. Bilbo usa sua astúcia e perspicácia para resolver os enigmas de Gollum e escapar de seu terrível destino. Essa habilidade de avaliar a situação e tomar decisões sensatas é um aspecto crucial da prudência.

Embora São Tomás de Aquino seja um filósofo medieval e Bilbo Bolseiro um personagem fictício, ambos abordam a importância da prudência como uma virtude essencial na tomada de decisões e na busca pela sabedoria. Nos lembram da necessidade de considerar cuidadosamente as circunstâncias, avaliar as consequências e agir de acordo com o discernimento prudente.

Gollum e a imprudência

Na saga de O Senhor dos Anéis, Gollum, de forma imprudente, demonstra toda a sua obsessão pelo anel buscando-o incessantemente e se tornando cada vez mais dependente do objeto.

Em sua jornada é visível a transformação devido à falta de prudência e sua ganância, o levando a isolar-se da sociedade, abandonando sua vida comum e a se tornar um ser perturbado e perigoso. O personagem com aparência animalesca não foi capaz de avaliar as consequências de suas ações nem considerar o bem-estar dos outros. Sua busca cega pelo anel o levou a cometer atos de traição e violência, causando sofrimento tanto para si mesmo quanto para os outros personagens. Todo este martírio, inclusive, é representado pela mudança da aparência física do personagem, que definha à medida que o tempo passa.

Assim, o contraste entre Bilbo e Gollum no filme ilustra como a falta de prudência pode levar a consequências negativas, enquanto a prudência permite uma tomada de decisão mais sensata e preserva a integridade pessoal. A história de Gollum serve como um alerta aos perigos de agir sem prudência, pois resultaram em sua própria queda e sofrimento, assim como na perturbação da paz e harmonia da Terra Média.

Prudência é saber distinguir as coisas desejáveis das que convém evitar.

Cícero

Justiça, ética e moral

A prudência está intrinsecamente ligada à justiça, ética e moralidade. Ela orienta as ações dos indivíduos considerando as consequências a médio e longo prazo. A prudência nos permite discernir entre o que é certo e o que é errado, levando em conta os valores morais.

Na saga de “O Senhor dos Anéis”, vimos que a prudência é uma qualidade essencial para a preservação da justiça e da ética. Os personagens que agem com prudência são capazes de tomar decisões que não apenas beneficiam a si mesmos, mas também o bem-estar de toda a sociedade.

A lição que fica é que protagonistas, sejam eles cidadãos comuns, líderes ou políticos, devem ser guiados pela prudência ao tomar decisões que afetam a vida de toda uma nação. A falta de prudência na administração pública pode levar a escolhas irresponsáveis, políticas desastrosas e corrupção generalizada, resultando no declínio de uma nação e na perda da confiança do povo.

Em nossa vida somos constantemente confrontados com situações que exigem decisões, sejam elas pequenas escolhas pessoais ou grandes determinações sociais. A forma como tomamos essas decisões pode ter um impacto significativo em nossas vidas e na sociedade como um todo. Neste contexto, a virtude da prudência emerge como uma qualidade fundamental para o sujeito protagonista, funcionando como um guia para os nossos caminhos, com sabedoria e discernimento.


Jorge Quintão – IoP

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